A proximidade do verão traz também uma preocupação: o aumento da
circulação dos mosquitos transmissores da febre amarela. Pela primeira
vez, o litoral de São Paulo terá um verão com a circulação do vírus.
Embora a vacina seja segura e o risco da doença seja alto, a
imunização é contraindicada para alguns grupos de pessoas. Em outros
casos, há precaução e é preciso avaliar o risco versus benefício da
vacina.
Indivíduos com imunidade muito baixa correm risco de desenvolver a
doença depois de tomar a vacina, uma vez que esta contém o vírus
atenuado, ou seja, enfraquecido. Isso serve para que, ao entrar em
contato com o organismo, ele estimule o sistema imunológico a criar
anticorpos.
Assim, se no futuro a pessoa entrar em contato direto com o vírus ao
ser picado por um mosquito transmissor, o corpo já estará com as defesas
preparadas para combatê-lo. No casos graves da doença, a taxa de óbito
chega a 40%, segundo especialistas consultados pela reportagem. "Na
situação em que vivemos no Estado de São Paulo, é evidente que o risco
da doença ultrapassa o risco da vacina", disse o infectologista Carlos
Magno Castelo Branco Fortaleza, membro da diretoria da Sociedade
Paulista de Infectologia (SPI).
Confira abaixo quais são os grupos em que há contraindicação ou
precaução para a vacina e quais os cuidados em caso de não poder ser
imunizado.
Bebês menores de seis meses
Segundo Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de
Imunizações (SBIm), esse grupo não deve tomar a vacina. "O vírus tem uma
capacidade de afinidade com o sistema nervoso. Em crianças muito
pequenas, a barreira entre o sangue e o sistema nervoso é frágil e
existe o risco de a vacina causar efeitos colaterais graves. A barreira
encefálica da criança ainda não tem estrutura e pode ter efeito
colateral neurológico", explica
Então, bebês com mais de seis meses de idade podem se vacinar? Não
exatamente. O Ministério da Saúde indica que a imunização seja apenas
para pessoas acima de nove meses. O especialista afirma que, entre seis e
nove meses, a vacinação é indicada em caso de surto ou quando a criança
mora em área de risco, onde a circulação do vírus é muito intensa. "Não
foram registrados casos (de febre amarela)entre seis e nove meses,
quase nenhum até um ano de idade", diz Kfouri.
Mulheres que amamentam
Há precaução para as lactantes. O especialista da SBIm afirma que
mulheres que amamentam bebês de até seis meses não devem ser vacinadas,
pois o vírus pode ser transmitido para a criança pelo leite. Porém, caso
ela viva em região de risco, a imunização está liberada.
O Ministério da Saúde recomenda suspender o aleitamento materno por
dez dias após a vacinação. Neste caso, é importante procurar um serviço
de saúde para orientação e acompanhamento a fim de manter a produção do
leite materno e garantir o retorno à amamentação.
Gestantes
Grávidas também estão no grupo de precaução. "Não se vacina a não ser
que a mulher viva em zona de risco", diz Kfouri. No caso de a mulher
morar em zona de circulação viral confirmada, ela deve ser vacinada.
Alérgicos a ovo
A vacina contra a febre amarela é produzida por meio do cultivo do
vírus atenuado em ovo de galinha. Assim, pessoas com alergia grave ao
alimento, com risco de anafilaxia, a imunização é contraindicada. Porém,
se o indivíduo alérgico necessitar, por algum motivo, da vacina, ela
deve ser feita sob supervisão.
Pessoas com doenças autoimunes
Artrite reumatoide, psoríase, lúpus e fibromialgia, por exemplo, são
doenças autoimunes, mas nem todas elas alteram a imunidade a ponto de a
pessoa ter reações graves à vacina. No geral, há uma precaução, segundo o
infectologista membro da diretoria da SPI. "A contraindicação é
absoluta nos casos que afetam o timo, órgão muito envolvido na imunidade
que tem sido associado a doença grave", explica.
No caso de lúpus, ele afirma que a indicação da vacina deve ser
avaliada de acordo com o risco aumentado versus o benefício da
vacinação. "Se a pessoa mora em zona rural ou área afetada próxima à
mata, considera-se que o risco da febre amarela é superior ao risco da
vacina. Mas se a pessoa com lúpus mora na cidade, o risco da vacina é
maior que o da febre e é contraindicada", explica Fortaleza. Segundo
cartilha do governo, pacientes com lúpus eritematoso sistêmico estão no
grupo da contraindicação devido à possibilidade de imunossupressão.
No caso dos reumáticos, há precaução e contraindicação, e ambas
dependem do tipo de medicamento que o paciente está usando e da
atividade da doença. "O tratamento é à base de medicação que induz
imunossupressão (que reduz eficiência do sistema imunológico). Se o
paciente está bem, sem tomar medicação, não há contraindicação, mas
fala-se em precaução. Se as medicações estão em doses maiores, tem
contraindicação por um período", orienta a reumatologista Gecilmara
Pileggi, coordenadora da Comissão de Doenças Infecciosas da Sociedade
Brasileira de Reumatologia (SBR).
Segundo a especialista, médico e paciente devem decidir em conjunto
se vale a pena suspender o medicamento temporariamente para tomar a
vacina. "Interromper a medicação pode ter risco maior, mas tem de pesar o
risco epidemiológico. Depois da vacina, é preciso esperar quatro
semanas para voltar a tomar a medicação", diz a reumatologista.
A SBR organizou um painel com especialistas e pacientes a fim de
definir melhor as pessoas com artrite reumatoide em relação à vacina
contra febre amarela. Quem está sem imunossupressão pode ser imunizado
com avaliação médica.
Pessoas com baixa imunossupressão estão no grupo da precaução e,
assim, "tem de avaliar o risco de perto, ver o quanto (o medicamento)
está segurando a doença", segundo Gecilmara. Já quem tem forte
imunossupressão sofre de um risco aumentado de tomar vacina e
desenvolver a infecção.
A reumatologista alerta que é importante procurar o médico com o qual
se faz o tratamento antes de tomar a vacina, não o do posto "Às vezes,
ele não vai entender a situação do paciente", explica. Ela reforça que
doenças como gota, artrose e fibromialgia não alteram a imunidade e, por
isso, não entram para o grupo de contraindicação. Pessoas com HIV e que
fazem quimioterapia também estão nesse grupo.
Pessoas com doenças neurológicas
A contraindicação ou precaução depende da doença, segundo o
infectologista da SPI. Há casos em que a doença neurológica aguda é
decorrente de dose anterior da própria vacina. "Nesses casos, deve-se
considerar risco versus benefício da vacina", diz O problema ocorre
quando o vírus provoca inflamação no sistema neurológico, gerando
encefalite, por exemplo, ou quando há degeneração nas células nas
semanas seguintes à vacina. "Poder ter enfraquecimento dos músculos ou
doença cerebral", explica Fortaleza.
Como se proteger
"A única forma de prevenção é evitar as áreas com circulação do vírus
e usar barreiras de proteção, como repelente e telas nas janelas da
casa", orienta Renato Kfouri. Para os grupos que não têm precaução ou
contraindicação para a vacina, o especialista alerta para não esperar os
casos da doença acontecerem para, só então, se vacinar. No começo do
ano, a alta demanda devido ao surto da febre amarela fez público
enfrentar filas de nove horas para conseguir a imunização. "É melhor
fazer isso sem atropelo, fora da epidemia", finaliza Kfouri.
Fonte: Estadão Conteúdo